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Carta Pastoral 2016 “JESUS LEMBRA-TE DE MIM” [Lc 23,42]

CARTA PASTORAL 2016
DIOCESE DE SANTO AMARO
“JESUS LEMBRA-TE DE MIM” [Lc 23,42]

Caríssimos irmãos e irmãs,
Há alguns meses assumi minha missão episcopal como bispo da Diocese de Santo Amaro e desejo, neste momento, manifestar o que sinto a respeito da caminhada deste Ano Pastoral de 2016. Uso deste meio para compartilhar esses sentimentos com todos e cada um de nossos diocesanos.

Gratidão

Antes de tudo, quero expressar gratidão ao meu caro irmão Dom Fernando Antonio Figueiredo, pela fraternidade e comunhão com que me senti acolhido desde o primeiro momento em que cheguei à diocese. Agradeço-lhe de coração e fico feliz por ele ter aceitado continuar a caminhar comigo a serviço da diocese que ele viu nascer e dirigiu como primeiro bispo e pai.Dirijo o meu “Muito obrigado” também aos presbíteros diocesanos e religiosos, que desde o primeiro encontro manifestaram-me apoio e solidariedade, dispondo-se a participar comigo no cumprimento da missão de dar a vida a esta porção de igreja. Desejo continuar a contar com a disponibilidade de todos.

Aos leigos e consagrados vai meu apreço e minha estima. Já deu para perceber o espírito de família que une todas as pessoas que, de alguma forma, estão construindo o Reino de Deus.

Ano da misericórdia

É importante, para nós, lembrarmos que estamos vivendo um momento histórico único; é o tempo da graça, o tempo da misericórdia. Jamais poderemos nos esquecer de que a Igreja é mestra e, pela luz do Espírito, propõe aos fiéis o que é necessário e favorável em cada momento da sua história. Neste tempo que estamos vivendo, o Papa Francisco proclamou o Ano extraordinário da Misericórdia para nos lembrar, antes de tudo, que o nosso “samaritano” é o próprio Cristo. É Ele que fez a primeira peregrinação para nos visitar, para nos consolar e curar as nossas feridas. “ Eis que estou à porta e bato; se alguém ouvir minha voz e abrir a porta, eu entrarei na sua casa e tomaremos a refeição, eu com ele e ele comigo”[Ap 3,20]. É Ele que bate à porta “santa” do nosso coração, que pede permissão para adentrar em nossas existências feridas pelos pecados e pelos traumas causados por caminhos errados que muitas vezes escolhemos. É Ele que bate à porta das nossas famílias, das nossas comunidades cristãs, para ver se ainda existe um lugar para Ele, ou se o nosso protagonismo, a nossa sede de autorreferência ou outro tipo de hóspedes indesejados já tomaram o seu lugar.

Simbolizando nossa disposição de ter o coração disponível para que Jesus nele entre e ocupe seu lugar, em nossa diocese foram abertas várias portas da misericórdia: na catedral, nos santuários e até em uma capelinha construída nas periferias da diocese, em Parelheiros. Aos passar por essas portas não nos esqueçamos de nelas deixar os pesos que carregamos em vão, e entremos com o desejo de sermos alcançados pelo amor de Deus, que quer fazer de cada um de nós uma obra nova, pois Ele quer nos gerar de novo.[Jo 3,1-8] O sentimento que nos deve acompanhar é o mesmo que São Paulo relata em 2Cor 5,17: “Se alguém está em Cristo, é nova criatura. Passaram-se as coisas antigas; eis que se fez realidade nova”.

Gosto muito de lembrar, a esse propósito, de alguém que poderia nos acompanhar no ato de entrar pela porta santa: o bom ladrão, que foi o primeiro, com Jesus, a entrar na porta santa do Paraíso, confiando na promessa que Jesus lhe fez: “Hoje estarás comigo no Paraíso”[Lc 23,42]. Para esse coitado, de cuja vida não conhecemos nada, e que o evangelista chama de “malfeitor” ou ladrão, a conversão aconteceu nos últimos instantes de sua vida. Mas o que foi que levou esse homem à conversão? Ele reconheceu seus pecados, quando disse ao colega: “Quanto a nós, é justo sofrermos, pagamos por nossos atos”. O bom ladrão não fugiu da verdade sobre si mesmo; ele soube admitir que diante dos erros deve prevalecer a justiça, e foi por causa disso que estava sendo crucificado. Ao mesmo tempo, contudo, ele não entendia porque Jesus, que não cometeu nenhum erro, que não tinha culpa nenhuma, estava pagando o mesmo preço.

O rosto da Misericórdia

A pergunta que surgiu no coração do bom ladrão abre para nós uma luz sobre o verdadeiro rosto do Senhor. “Por que ele, que não fez nenhum mal, está aqui ao nosso lado, que cometemos muitos erros na vida?” Ele está aqui comigo para que eu possa estar com ele. Essa é a verdadeira revolução do amor! Deus se faz próximo a mim justamente quando me sinto sobrecarregado pelo peso da cruz dos meus pecados, pela decepção dos meus fracassos, das minhas lentidões… quando me sinto só e abandonado por todos; nesses momentos ele se torna um crucificado como eu e assume minha mesma condição de pecador. É esse o momento em que sou chamado a olhar para a Cruz e enxergar o rosto da misericórdia. O Amor do Senhor chegou até esse ponto: Ele experimenta comigo o sofrimento, não me deixa só, está próximo a mim na dor e nos meus dramas existenciais, e isso me tira qualquer dúvida, Deus é amor e me ama, mesmo eu sendo um pecador.

Neste ano, queremos incentivar nossos diocesanos a procurarem o sacramento da confissão. Por esse meio, quantas pessoas poderiam fazer a mesma experiência do bom ladrão, de sentir a necessidade, depois de muitos anos vividos à sombra do pecado, de buscar alguém que pode lhe oferecer uma luz através da graça do perdão? Quantas são as pessoas das nossas comunidades que estão precisando de consolo, depois de ter sofrido por causa das chagas do passado? Quantas são as pessoas que abandonaram o barco da igreja e sentem a necessidade de voltar, para desfrutar a segurança e a força da fé?

Convido, portanto, todos os presbíteros a fazerem de suas paróquias lugares onde os penitentes possam encontrar a possibilidade de reconciliar-se com Deus e com os irmãos. Não desperdicemos este momento de graça que a Igreja está vivendo: “Hoje é o tempo favorável, hoje é o tempo da salvação”. [2Cor 6,2]

“Jesus , lembra-te dele.”

Os malfeitores ao pé da cruz eram dois, mas em um primeiro momento levamos em consideração apenas o bom ladrão. E o outro? O que podemos dizer dele? Parece que há sempre alguém em todas as peças de teatro que vem estragar a cena apresentada. É a atitude deste condenado que, em lugar de silenciar e deixar que tudo corra conforme o combinado, assume o papel de ser o “do contra”; ele desafia Jesus e quer que este faça a vontade dele; quer tirar Deus da cruz, dizendo: “Tu não és o Cristo? Salva-te a ti mesmo e a nós”. [Lc 23, 39] Ele representa a parte de humanidade que pensa conforme o mundo, não como Deus. Jesus já se tinha defrontado com uma situação semelhante quando, nas palavras de Pedro, que desejava que ele evitasse o sofrimento e a cruz, viu uma tentação de satanás, e disse: “Vai para trás de mim, satanás! Tu estás sendo para mim uma pedra de tropeço, pois não tens em mente as coisas de Deus, e, sim, as dos homens”[Mt 16,23]. O outro ladrão, portanto, representa para Jesus novamente a voz do diabo, que ele havia encontrado no deserto e que lhe prometera voltar no tempo oportuno: “terminadas todas as tentações, o diabo afastou-se dele (Jesus) até o tempo oportuno.” [Lc 4,13]

Aquele condenado ao lado de Jesus na cruz representa os homens e as mulheres que ficam do lado de fora, enquanto nós entramos pela porta santa. Dói o coração afirmar isso mas, na realidade, são muitas as pessoas que permanecem do lado de fora dessa porta. Essa realidade deve ser enfrentada como Jesus ensinou, como faz o pastor, que deixa as noventa e nove ovelhas no campo e vai atrás da que estava extraviada. Nos dia de hoje, contudo, talvez tenhamos que admitir ser necessário ir procurar a maioria do rebanho, que se perdeu e está fora do redil.

Aquele condenado representa a imagem do “diferente” da sociedade, daquele que nos incomoda, que veio para estragar a festa; é aquele que devemos suportar, mas que gostaríamos de eliminar ou que desejaríamos que nem existisse. É o filho drogado, que só dá dor de cabeça para os pais e desafia o amor que lhe devotam; é o assaltante que atenta contra a nossa segurança; é o assassino que ameaça constantemente a nossa vida; é o alcoólatra por quem temos repugnância; é o mendigo de rua que encontramos nas encruzilhadas e que, ao ver, agradecemos a Deus por não ser como ele… A sociedade está cheia de pessoas assim: irmãos que encontramos todos os dias em nosso caminho, ou que às vezes até vivem em nossas casas. Jesus morreu ao lado dos dois ladrões; prometeu o paraíso para um e ao outro, que o insultava, não prometeu e nem ameaçou com a condenação.

Gosto de imaginar que Jesus ao inclinar a cabeça, antes de morrer, tenha cruzado o último olhar com o desse condenado, como a esperar um sinal de abertura do coração enrijecido. Jesus já tinha invocado o perdão sobre todos os que o estavam crucificando e insultando…”porque não sabem o que fazem” [Lc 23,34], mas esperava, que antes do último suspiro, sendo olhado com amor, o condenado se abandonasse à Misericórdia!

Percebo que o próprio Cristo, doando seu sangue pela humanidade, nos deixou um legado: cuidar dessas pessoas condenadas pela vida; ter um cuidado especial com esses irmãos, vítimas de uma sociedade doente, dominada pela cultura do “descarte”. Peçamos a Jesus que nos “empreste” o seu olhar, para que possamos, de verdade, amar esses pobres que são os mais pobres do nosso tempo. Eles nos incomodam, nos desafiam, mas isso não é razão para deixarmos de rezar por eles e de participarmos de ações concretas para trazê-los de volta, para a casa do Senhor.

A esse propósito, sinto como impelente o apelo do Santo Padre, quando afirma no documento “A alegria do Evangelho”, que deseja uma Igreja “em saída”, com as portas abertas. Diz ele que “sair em direção aos outros, para chegar às periferias humanas não significa correr pelo mundo sem direção nem sentido. Muitas vezes é melhor diminuir o ritmo [de nossa vida], pôr de parte a ansiedade, para olhar nos olhos [dos outros] e escutar, ou renunciar às urgências para acompanhar quem ficou à beira do caminho” [46].

Que Deus nos conceda, ao longo deste Ano da Misericórdia, a graça de não nos esquecermos nas nossas ações pastorais, desses irmãos necessitados que “ficaram à beira do caminho” e que, infelizmente, não entraram pela porta santa, ficaram do lado de fora. O Papa nos sugere, se for necessário, diminuirmos o ritmo de nossas vidas, descartarmos a ansiedade por fazer as coisas, para prestarmos mais atenção ao nosso próximo, olhando em seus olhos, escutando a sua história, consolando-os, enxugando suas lágrimas … Nós temos o dever de lembrar aos nossos irmãos que, do lado aberto de Cristo Crucificado, saíram as águas dos rios da Misericórdia que a todos querem banhar, para curar todos os males.

Missionários da misericórdia!

Os bispos e os padres sentem muito como são profundas e fortes as palavras de Jesus, que nos envia para levar a todos e a todas a graça da misericórdia e do perdão. Nesse sentido, a exemplo do Santo Padre, enviamos todos os presbíteros da nossa Diocese para que, em suas paróquias, sejam testemunhas da misericórdia e, como o Bom Samaritano, curem através dos sacramentos, as feridas do nosso povo.

Na Visita Pastoral que comecei a realizar neste ano, estarei manifestando a alegria de ser um missionário que anuncia e mostra a proximidade de Deus com o povo. Essa proximidade é a expressão privilegiada da cura do Bispo, que se faz presente nas paróquias para conhecer a realidade delas, para encorajar, aconselhar, consolar o povo santo de Deus que lhe foi confiado. Ao longo deste ano, se for da vontade de Deus, visitarei todas as paróquias dos setores Jordanópolis e Cupecê.

“Jesus, lembra-te de nós”

“Junto à cruz de Jesus estavam de pé sua mãe e a irmã de sua mãe, Maria de Cléofas, e Maria Madalena.” [Jo 19,25]

Na cruz, Jesus já nos havia dado tudo o que tinha: a própria vida, a própria vontade, o próprio sangue e, quando viu sua mãe, quis nos oferecer ela mesma, seu presente mais bonito, despojando-se até o fim. Como relata o evangelho de S. João, Maria esteve presente no começo da vida pública de Jesus, em Caná da Galiléia, quando intercedeu e conseguiu que Jesus realizasse o seu primeiro milagre, alertando os servos com estas palavras: “Fazei tudo o que ele vos disser”[Jo 2,5]. No momento em que estava terminando a missão de Jesus, ela assumiu o papel daqueles servos e acolheu com alegria as últimas palavras de seu Filho, quase como se fossem o seu testamento. Maria, de fato, foi a primeira a receber o mandado para doar-se, para oferecer-se a seus filhos que se sentem órfãos por terem “perdido” o Mestre. Maria foi entregue à igreja nascente para garantir a proximidade de Deus, que ama e consola seus filhos. Maria foi confiada ao apóstolo João, representante de todos os apóstolos, para que ele lembrasse que a Igreja é Mãe. A Igreja deve mostrar esse rosto da maternidade de Maria e acolher a todos com um coração materno.

Jubileu Diocesano: romaria a Aparecida

Jesus realmente lembrou-se de nós enviando-nos sua mãe para nos consolar e nos dar a certeza de que Deus “não cansou do mundo”. Percebemos isso nas inúmeras visitas que Maria realizou nesta terra, nos lugares mais impensáveis, através de várias aparições.

Cientes da importância que tem Maria na Igreja, decidimos comemorar o aniversário de 27 anos da criação da Diocese de Santo Amaro realizando uma grande romaria ao Santuário Nacional de Nossa Senhora Aparecida, marcada para o dia 4 de junho. Com isso, viveremos, como diocese, o espírito do Jubileu do Ano santo da Misericórdia e agradeceremos a Deus cantando, juntamente a Maria, o nosso magnificat: “Grandes coisas fez em nós, nas nossas paróquias e comunidades o Todo Poderoso, e Santo é seu Nome!”.

Centenário das Aparições de Nossa Senhora em Fátima

No dia 13 de maio deste ano começam os festejos do centenário das aparições de Nossa Senhora em Fátima. Ela é a padroeira da nossa Diocese e, neste ano, desejamos consagrar ao seu Sagrado Coração Imaculado a Diocese toda, com as suas paróquias, comunidades, clero, consagrados, famílias… Uma coisa que notei ao visitar todas as paróquias da nossa diocese, e que me deixou muito feliz, foi ver como a imagem de Nossa Senhora de Fátima está presente em todas elas. Esse é um sinal da grande devoção que o nosso povo tem para com Nossa Senhora.

São João Paulo II, em uma visita ad limina dos bispos brasileiros, teria dito a um bispo que lamentava o fato de determinada paróquia estar perdendo muitos fiéis. Falou que era necessário organizar grandes procissões com a imagem de Nossa Senhora e consagrar a Ela, através da oração do terço, todos os paroquianos. Soube-se, mais tarde, que a fé naquela paróquia teria reflorescido, inclusive com o dom de muitas vocações.

Inspirando-se nesse fato, o Conselho de Pastoral de nossa Diocese decidiu trazer de Fátima (Portugal) uma réplica da imagem de Nossa Senhora. No dia 13 de maio deste ano essa imagem será abençoada e coroada, será levada em uma procissão luminosa, da Catedral até o Santuário que lhe é dedicado e, dali, a imagem peregrina visitará todas as nossas paróquias e comunidades, levando a todos a mensagem que trouxe aos homens com sua aparição, no dia 13 de maio de 1917. O centenário será encerrado com uma grande concentração diocesana no fim do ano de 2017.

Sob o olhar e a proteção da Virgem de Fátima, quero desejar a todos uma Santa Páscoa. Peço que Cristo Ressuscitado traga para a nossa diocese e aos nossos corações Luz e Paz.

 

+ José Negri, PIME

São Paulo, 24 de março de 2016
Quinta feira Santa